Objeto do desejo do PT e do PSDB neste segundo turno da eleição presidencial, o Partido Verde defende desde 2005, em seu programa partidário, a “legalização da interrupção voluntária da gravidez” e o uso da maconha para “fins pessoais”. Os temas contrastam com as propostas dos presidenciáveis Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), que têm levado ao palanque discursos “em favor da vida”, como parte de um esforço para conquistar parte dos quase 20% dos votos válidos recebidos pela senadora Marina Silva (PV), nas eleições de 3 de outubro.
Evangélica, Marina destacou-se na eleição presidencial deste ano dizendo-se contrária à descriminalização do aborto e ao uso da maconha. Os temas, segundo ela, deveriam ser discutidos por meio de plebiscito. O PV, no entanto, tem em seu programa – consolidado após a Convenção Nacional do partido, em 2005 – referências claras à defesa da mudança da lei que rege essas questões. No capítulo “Reprodução humana e cidadania feminina”, o partido defende que seja legalizada a interrupção voluntária da gravidez “com um esforço permanente para redução cada vez maior da sua prática através de uma campanha educativa de mulheres e homens para evitar a gravidez indesejada”.
O PT também tem como diretriz a descriminalização do aborto, conforme demonstram as posições assumidas após o 3º Congresso da sigla, realizado em 2007. Já do lado tucano, o assunto também apareceu no Programa Nacional de Direitos Humanos produzido sob o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O documento, de 2002, defendia, por exemplo, mudanças no Código Penal “referentes ao estupro, atentado violento ao pudor, posse sexual mediante fraude, atentado ao pudor mediante fraude e o alargamento dos permissivos para a prática do aborto legal”. O documento também defendia que o aborto fosse considerado tema de saúde pública.
Hoje, os partidos se esforçam para afastar essas teses de seus palanques. Apesar das discussões conduzidas pelo governo FHC, Serra já afirmou que não mexeria na legislação sobre o aborto porque a mudança “criaria uma verdadeira carnificina no País”. Ele, no entanto, já foi alvo de críticas de religiosos durante sua gestão no Ministério da Saúde, no governo FHC, por normatizar a realização do aborto em 1998. Serra também já foi criticado porque, em 2001, o ministério começou a distribuir com Estados e municípios a chamada ˜pílula do dia seguinte˜.
Drogas
O uso da maconha, tema também rechaçado por Marina (que já declarou jamais ter consumido sequer bebida alcoólica), é também defendido pelo PV. Na seção Justiça e Segurança de seu programa, em que pede uma nova Lei de Entorpecentes, “legalizando o uso da Canabis Sativa para fins industriais, médicos e pessoais, descriminalizando o uso de drogas, que passa a ser encarado, em situações de dependência de drogas pesadas, como um problema de saúde e não de repressão e prisão”.
No programa do PV, o consumo de drogas deve ser encarado como problema policial apenas no caso em que estiver associado a outro delito – nos moldes do que acontece com o abuso de álcool. A penalização para o uso, defende o documento, deve ser diferenciada na repressão ao tráfico de acordo com os dados que provocam à saúde.
Dilma e Serra já afirmaram, durante a campanha, que são contra a descriminalização do uso da maconha. Enquanto trocam acusações sobre quem é mais “perigoso” para a liberdade de expressão, PT e PSDB também buscam o apoio de um partido que defende temas polêmicos como “mecanismos de desestímulo e taxação sobre ‘enlatados’ de TV estrangeiros que explorem a violência” e o fim à tutela exclusiva do poder político sobre as concessões de TV e rádio.
O PV defende também a descriminalização de atividades como os jogos de azar e o jogo do bicho e o fim do serviço militar obrigatório. Afirma também ser favorável à “liberdade sexual, no direito do cidadão dispor do seu próprio corpo e na noção de que qualquer maneira de amor é valida e respeitável”. Serra, por sua vez, é a favor da união civil entre homossexuais, mas afirma que classificar o ato como “casamento” é uma questão religiosa. Dilma também diz ser favorável à união, mas evita chamar a questão como religiosa.
Definição do apoio
Em reunião ocorrida na quarta-feira, a Executiva Nacional do PV confirmou para o próximo dia 17 a definição sobre se apoiará um dos presidenciáveis ou se deve ficar neutro na disputa. Lideranças petistas afirmam que o compromisso com as teses de Marina, espécies de contrapartidas para o anúncio do apoio, sejam mais importantes do que a coerência com o programa do PV. Marco Aurélio Garcia, por exemplo, um dos principais coordenadores da campanha petista, afirma que muitas das teses de Marina são “perfeitamente absorvíveis” pelo PT.
Já o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) acha que os tucanos e verdes tem muitas divergências programáticas, mas que elas seriam menores do que as do PV com o PT. Na avaliação do senador, a relação de Marina com os petistas teria uma diferença maior ainda. “Nem de um lado nem de outro há um consenso absoluto. O programa (do PV) difere em relação ao Serra e todo o PSDB em alguns casos. Mas as contradições da Marina com a Dilma já são conhecidas, tanto que ela deixou o governo”, diz Dias.
Procurado para comentar as diferenças em relação a outros partidos, o ex-coordenador da campanha de Marina, o deputado federal eleito Alfredo Sirkis (PV), não atendeu os telefonemas feitos pela reportagem. José Luiz Penna, presidente nacional do PV, estava em voo e não poderia atender a reportagem antes das 22h, de acordo com a assessoria do dirigente.
Colaboraram Piero Locatelli e Ricardo Galhardo
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