segunda-feira, 4 de outubro de 2010

FHC e Lula para convencer Marina Silva

Antes mesmo de se reunir para debater estratégias, as campanhas de Dilma e de Serra deveriam convocar imediatamente Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso para ver quem consegue botar o guizo no gato --ou seja, quem consegue arrancar o apoio de Marina Silva no segundo turno.
Marina tem carinho e respeito por ambos, Lula e Fernando Henrique, apesar das mágoas que guarda de Lula e de seu tempo no governo, quando vivia batendo de frente com Dilma em defesa do Meio Ambiente, da sustentabilidade. E perdendo, diga-se.
Nas vésperas da eleição, o que se tinha era que Marina Silva tendia a ficar neutra, o PV era favorável ao apoio a Serra e o eleitorado de Marina eram majoritariamente pró-apoio ao tucano no segundo turno. Pesquisa Datafolha no eleitorado verde deu 51% para Serra, 31% para Dilma.
Como Marina e o seu eleitorado não são um PMDB, não adianta os dois lados tratarem a questão na base do troca-troca de cargos e favores. Convém assumir seriamente o compromisso de adotar a proposta de sustentabilidade e empunhar de fato essa bandeira, condição essencial para qualquer tipo de conversa.
A tradição, um tanto óbvia, mostra que candidato que sai na frente no primeiro turno tende a ganhar a eleição no final, mas isso não é uma determinação divina, sempre há exceções. Por isso, apesar do abatimento, a campanha de Dilma continua em franca vantagem. E a de Serra não tem tempo a perder, muito menos a perder com disputas de ego e briguinhas internas, tão comuns no PSDB, no DEM e no PPS.
Geograficamente, Dilma teve uma vitória avassaladora no Amazonas e no Nordeste, como previsto, e Serra recuperou-se em São Paulo e no chamado "cinturão do agronegócio", pegando Paraná e Mato Grosso do Sul, por exemplo. Mas ele perdeu de Dilma também em dois Estados-chave, pelo peso do eleitorado, da economia e da política: Rio de Janeiro e Minas Gerais. Não será fácil inverter esse jogo. O foco está em Aécio Neves, que tem forte aceitação em ambos e se mantém como cabo eleitoral imbatível em Minas.
De outro lado, há dúvidas sobre a capacidade de Lula em aumentar os votos para sua candidata. Será que está esgotada? Como já escrevi neste espaço e agora está claríssimo até mesmo para os coordenadores de Dilma, Lula foi decisivo no primeiro momento, mas a perspectiva de vitória lhe subiu a cabeça e ele passou a atrapalhar mais do que ajudar quando trocou o figurino "paz e amor" pelo da pancadaria contra a imprensa e contra os adversários. A queda de Dilma tem muito de "pera lá!".
Não se pode fingir que não percebeu que Lula passou os últimos anos e a campanha eleitoral inteira agarrado com Dilma, especialmente no "Jornal Nacional" da TV Globo, mas simplesmente sumiu quando saiu o segundo turno. Não quis dividir "a derrota"?
O momento, aliás, é de parar para pensar e refazer o tom, o discurso, as alianças e a estratégia geral das campanhas. No segundo turno, é candidato a candidato, Dilma e Serra, cara a cara.
Mas, apesar dessa sensação de recomeço, a equação do primeiro turno permanece: Dilma não pode continuar errando, mas Serra, além de não errar, precisa muitíssimo acertar. O problema sempre é: como?
Uma boa dica está nas eleições de 2002 e principalmente de 2006. O PT deslanchou no segundo turno, o PSDB perdeu o ímpeto, a graça, o discurso. É como se tivesse cansado, entregado os pontos. Resultado: encolheu.
Teremos muitas emoções, alguns sobressaltos e uma boataria infernal até 31 de outubro. A versão petista de Alckmin venderia a Petrobras e o Banco do Brasil foi decisiva contra os tucanos em 2006. Martelar as incongruências de Dilma quanto ao aborto na nova classe "C" mostrou o quanto o efeito de tudo isso foi fundamental para a constante queda de Dilma na reta final.
Nem sempre o que parece é, mas se ganham eleições geralmente com o que parece, não exatamente com o que é.

Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha em Brasília.

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